O Deserto da Memória
Descrição
"O Deserto da Memória" conta a história de um deserto místico. Como um cérebro, ele é capaz de lembrar e esquecer de eventos nele ocorridos, conforme os ventos enterram e desenterram suas memórias na areia. Essa premissa resulta em uma dramaturgia não-linear que, usando elementos fantásticos, aborda temas relacionados à memória: o seu caráter fragmentário, a relação entre memórias pessoais e coletivas (históricas), a memória de lugares. Tomando como referência o Deserto do Atacama no Chile, o espetáculo também cria metáforas sobre a história da América Latina, abordando temas como: a dominação dos europeus sobre os indígenas, as ditaduras militares da segunda metade do Século XX, alguns elementos do imaginário dos povos desse continente (como a cidade asteca de Tenochtitlan, ou inspirações vindas da literatura brasileira e latino-americana). No Deserto da Memória, os caminhos de várias personagens se entrecruzam: uma velha que segue à procura de uma pessoa desaparecida à muito tempo; um velho que se perdeu de seu menino; uma menina que brinca entre as dunas, descobrindo objetos e suas histórias; um menino que rouba estrelas; um demônio autoritário que luta contra um guerrilheiro falastrão. Enquanto algumas delas buscam desenterrar memórias escondidas, outros preferem que as coisas permaneçam no esquecimento. Todas essas personagens são interpretadas apenas por dois atores que, conforme alternam incessantemente entre tantas figuras diferentes - contando para isso apenas com sua expressão corporal, sem recorrer a trocas de figurinos e cenários -, refletem o caráter fragmentário da memória. Além disso, se alternam de modo a variar os diferentes modos com que o espetáculo cria suas metáforas sobre a história e cultura da América Latina: ora de uma maneira mais nostálgica e melancólica criada pelas lembranças dos velhos, ora por uma atmosfera mais lúdica e cômica que é criada pelas brincadeiras frenéticas das crianças (em uma das cenas do espetáculo, por exemplo, referências satíricas são feitas às ditaduras militares da segunda metade do século XX, quando as duas crianças começam a discutir para quem seria a rainha, o bobo, a presidenta ou o ditador que seria bobo o suficiente para governar a "bobolândia"). O espetáculo é uma produção do Grupo Nós de Teatro, que elabora suas obras por meio de processos colaborativos de criação de teatro de grupo, prática recorrente em produções contemporâneas. No caso específico do trabalho do Grupo Nós, a construção tanto da encenação quanto da dramaturgia ocorre de maneira concomitante, sendo ambas baseadas no processo de improvisação e composição dos atores em sala de ensaio.