De vez em quando
Descrição
A partir do conto "As Margens da Alegria" de Guimarães Rosa, o trabalho de ator se desenvolveu e resultou na cena apresentada. Em cena, um menino que perde sua inocência ao deparar-se pela primeira vez com a morte e a crueldade humana. O ser inocente da criança olha para o mundo e sua imaginação permite múltiplas versões do cenário a sua frente, os passarinhos que voam, a terra e o céu em nuvens de repente se transformam em outras coisas e contam histórias que somente a mente da criança é capaz de captar. O desafio do ator para captar e atingir tal modo de ser inocente se tornou a principal tarefa para a criação da cena apresentada. Esse processo de criação teatral propõe a reflexão sobre o ínfimo agora, onde tudo é capaz de acontecer, sendo o presente, o único instante que temos para viver, a criança com a sua imaginação é capaz de prolongar e viver muitas coisas em um mesmo período de tempo em que um adulto vive apenas um mundo, e essa é a magia que somente a inocência da criança é capaz de fazer acontecer. A linguagem da criança e do corpo é a da liberdade. Na brincadeira de espiar, buscando a precisão do olhar, surgem os passarinhos que bebem cachaça e hipnotizam a visão, o corpo reage dançando pelo espaço se embriagando com o voo dos pássaros. Intencionado com o encanto e o desencanto da ação de ver do menino do conto de Rosa, encontrei reações a partir daquilo que olhava e revelava a alma quando os olhos se deparavam com um mistério. Todas as coisas existentes escondem um mistério e a experiência diante de um espaço em branco, acontece "assim como um crescer e desconter-se, como o ato de respirar" do menino do conto.
Caminhando sempre na margem da alegria sabendo que todas as coisas
estão mortas vivas, e que depende de um olhar e um respirar para dar existência
àquilo que se planta na terra do corpo. E peregrinando por essa terra em busca de
autoconhecimento, cheguei ao sagrado agora, que me trouxe o presente instante em
que vivo e morro para poder continuar nascendo.
De vez em quando a vida/ de vez em quando a morte/ de vez em quando
alegria.../ Naqueles dias/ de vez em quando sou/ de vez em quando estou/ mas
sempre a caminhar.