Como se pudéssemos esquecer
Descrição
Em "como se pudéssemos esquecer" Francisco Mallmann tenciona os limites da imagem fotográfica ao propor um traçado que se repete em cada um dos materiais que compõe o trabalho. Um traço vermelho invade a fotografia preta e branca a cada frame de vídeo, como se criando uma cartografia, um desvio, um risco no enquadramento de cada parte do filme. Em cada paisagem uma cisão, uma divisão, um impedimento de totalidade. Aqui temos o afastamento da "imagem total" - a cena inaugural, a invasão de descobridor que vê e nunca é visto. Uma mancha que propõe a torção do olhar. "como se pudéssemos esquecer" é uma videoarte que pretende complexificar a hegemonia das imagens. Uma vez que a estética moderna/colonial se constituiu centralizando o sentimento atrelado a visualidade como categoria principal da percepção do mundo, e o prazer como categoria principal da experiência estética, uma discursividade que se centraria na "cognição humana" , acaba por revelar desumanizações no interior do conceito de "humanidade" . Isso porque, o pensamento europeu moderno/colonial aborda a imagem não em termos de pertencimento mútuo a um mesmo mundo, mas antes na relação do mesmo com o mesmo – instaura-se, assim, uma distribuição profundamente desigual dos recursos da vida e das noções de cidadania amparados por uma narrativa estética circunscrita em um modo de representação baseado em um olhar universal que, ele mesmo, se abstém de seu lugar de observação. A modernidade e sua concepção segundo a qual as imagens do mundo se diferenciava em inferiores e superiores, irracionais e racionais, primitivos e civilizados, tradicionais e modernos permite que a criação artística e a experiência estética se deem, elas mesmas, avolumando e sendo avolumadas pela instauração de identidades sociais e categorias de (des)humanidades produzidas a partir de uma visualidade eurocentrada. Ficções espaciais dicotómicas de baixo/encima e inferior/superior, configuraram tanto geopoliticamente como socialmente a consolidação do sistema mundo moderno colonial dividido em centro e a periferia também no que tange a própria possibilidade de/da arte. Na ordem moderna/colonial, é a partir do "prazer de ver" – que tem o olhar como seu objeto de desejo – que serão instaurados os "mito das origens, a cena primária", e o "fetichismo" que posicionará os sujeitos – suas imagens e possibilidades de articulação/criação – na modernidade/colonialidade com ficções tais quais as da "descoberta". A colonialidade do ser inclui a colonialidade da visão e dos demais sentidos que são meios em virtude dos quais os sujeitos têm um senso de si e do seu mundo. Uma exploração da colonialidade do ser, portanto, requer uma averiguação da colonialidade do tempo e espaço, bem como da subjetividade incluindo a colonialidade do ver, do sentir e do experenciar – o que coloca a produção de imagens no centro de tais investigações.
Autor
Francisco Mallmann